A IMPENITÊNCIA FINAL E AS CONVERSÕES “IN EXTREMIS”

 A IMPENITÊNCIA FINAL E AS CONVERSÕES “IN EXTREMIS”
 
 
 
Como toda nossa vida na eternidade depende do estado da alma no momento da morte, urge falar da impenitência final, que se opõe a boa morte e, por contraste, falaremos também das conversões “in extremis”.
A impenitência de um pecador cifra-se na ausência ou privação da penitencia que devia destruir nele as consequências morais do pecado ou da revolta contra Deus. Estas consequências do pecado traduzem-se na ofensa feita a Deus, na corrupção da alma revoltada e desorientada, nos justos castigos que mereceu.
Destroem-se as consequências do pecado através da reparação satisfatória, isto é, pela dor de ter ofendido a Deus e mediante a compensação expiatória. Como diz Santo Tomás (1), requerem-se estes atos da virtude da penitencia para a salvação do pecador; exige-nos a justiça e a caridade para com Deus e também a caridade para conosco próprios.
A impenitência traduz-se na ausência de contrição e satisfação; pode ser temporal, se se considera no decurso da vida presente, e final, se se refere ao momento da morte. Convém ler o sermão de Bossuet sobre o endurecimento, que é o castigo dos pecados precedentes (2).
 
O QUE É QUE NOS PREDISPÕE PARA A IMPENITÊNCIA FINAL
 
A impenitência temporal predispõe-nos para a impenitência final. Pode revestir-se de duas formas muito diferentes: impenitência de fato, isto é, simples ausência de arrependimento; e impenitência de vontade, resolução positiva de não se arrepender dos pecados cometidos. Neste último caso, há pecado especial de impenitência que, no seu grau mais elevado é um pecado de malícia, que se comete, por exemplo, ao assinar um contrato de enterro civil.
A diferença entre estas duas formas é considerável sem dúvida. Se a alma se vê surpreendida pela morte no simples estado de impenitência de fato, dá-se a impenitência final, sem que se tenha preparado diretamente para um pecado especial de endurecimento.
A impenitência temporal de vontade conduz diretamente à impenitência final, embora Deus, por um ato de misericórdia especial, preserve desta muitas vezes. Por este caminho de perdição, pode chegar-se a querer permanecer no pecado deliberada e friamente, repelindo a penitencia que dele nos livraria. Como dizem Santo Agostinho e Santo Tomás (3), está espécie de impenitência constitui, nessa altura, não só um pecado de malícia, mas também um pecado contra o Espírito Santo, isto é, um pecado que vai diretamente contra o que poderia salvar o pecador.
Este deve, pois, fazer penitencia no tempo próprio, por exemplo, no tempo da comunhão pascal, de outro modo passará da impenitência de fato para a impenitência de vontade, ao menos por omissão deliberada. Santo Tomás diz que tanto mais necessário voltarmos a Deus, quanto é certo que não podemos permanecer muito tempo no pecado mortal sem cometermos novos pecados, os quais apressam a queda (4).
Portanto, não devemos esperar pela morte para nos arrependermos. A Escritura impele-nos a fazê-lo sem demora: “Não espere pela morte para cumprires” (Ecles., XVIII, 21). São João Batista, na sua pregação, não cessava de falar na urgente necessidade do arrependimento (Luc., III, 31). Jesus repete-o igualmente desde o começo de seu ministério: “Fazei penitencia e crede no Evangelho” (Marc., I, 15). Mais tarde ainda: “Se não fizerdes penitencia, todos perecereis do mesmo modo” (Luc., XIII, 5). São Paulo escreve aos Romanos (II, 5): “Com a tua dureza e coração impenitente acumulas para ti um tesouro de ira no dia da ira e justo juízo de Deus que há de dar a cada um segundo suas obras”.
No Apocalipse (II, 16) diz-se ao anjo da Igreja de Pérgamo: “Faze igualmente penitencia; de contrário, virei a ti livremente”. Anuncia-se assim a visita da justiça divina, para a hipótese de não termos em conta a visita da misericórdia.
A impenitência temporal voluntária registra numerosos graus (5).
Partindo dos menos graves que, todavia, já são muito perigosos, encontramos o grau dos endurecidos por ignorância culposa, que se fixam no pecado mortal e na cegueira que certamente os leva a preferirem os bens temporais aos bens da eternidade. Bebem da iniquidade como se fosse água, com uma consciência adormecida ou sonolenta porque sempre descuraram gravemente o conhecimento dos deveres indispensáveis à salvação. Há muitas pessoas nesta condição. Deparamos depois com os endurecidos por covardia, os quais, mais esclarecidos e mais culpados que os anteriores, não tem energia para quebrar os laços da luxúria, da avareza, do orgulho e da ambição que criaram para si mesmos. Não pedem, na oração, a energia que lhes falta. Vêm por último, os endurecidos por malícia, designadamente aqueles que nunca rezam e se revoltam contra a Providencia, após alguma infelicidade, ou ainda os escarnecedores envolvidos nas suas desordens, blasfemadores descontentes por tudo e por nada; materialistas que, se mencionam Deus, é para o injuriarem; e, finalmente, os sectários, que manifestam ódio constante contra a religião cristã e não cessam de atacá-la com seus escritos.
Entre uns e outros há muita diferença, evidentemente. Todavia, não se pode afirmar que, para chegar a impenitência final, seja preciso um endurecimento por malícia ou, ao menos, um endurecimento por covardia ou por ignorância voluntária. Não podemos afirmar que Deus use de misericórdia para com todos os outros pecadores menos culpados.
Também não podemos dizer que serão condenados todos os endurecidos por malícia, porque a misericórdia divina converteu, por vezes, grandes sectários que pareciam obstinados no caminho da perdição (6).
Os Padres da Igreja, porém,  e depois deles os melhores pregadores, ameaçaram muitas vezes com a impenitência final aqueles que se recusam a converter-se ou adiam a sua conversão sempre para mais tarde (7). Depois de terem abusado tanto das graças de Deus, terão eles socorro eficaz, necessário à conversão? Levantam-se muitas dúvidas.
 
A CONVERSÃO É DIFÍCIL, MAS REALMENTE POSSÍVEL
 
O endurecimento que a cegueira pressupõe, a perversão do discernimento e uma tal predisposição da vontade para o mal, que o bem já quase não atrai, tornam a conversão bastante difícil.  Já não se tira proveito dos bons conselhos ou dos sermões, já não se lê o Evangelho nem se frequenta a Igreja; resiste-se mesmo às advertências salutares de pessoas de bem. O coração torna-se duro como uma pedra. Isaías tem também algumas palavras para os que se encontram neste estado (V. 20-21): “Infelizes daqueles que chamam bem ao mal e mal ao bem, que fazem das trevas luz e da luz trevas, que tornam amargo o que é doce e doce o que é amargo! Infelizes daqueles que são sábios aos seus próprios olhos e inteligentes em sua própria opinião”.
Tudo isso se deve a pecados reiterados, hábitos viciosos, a ligações criminosas, a leituras nas quais se bebe claramente o erro, fechando os olhos à verdade. Depois de tantos abusos da graça, sucede que o Senhor recusa ao pecador não somente o socorro eficaz de que fica privado todo pecador habitual no momento em que cai, mas também a graça proximamente suficiente, que tornaria possível a observância dos mandamentos.
E, no entanto, ainda se pode dar a conversão. O pecador endurecido recebe ainda graças suficientes remotas, por exemplos, durante uma missão ou por altura de uma provação. Mercê desta graça suficiente remota, não pode ainda cumprir os preceitos mas já pode começar efetivamente a rezar. As coisas passam-se deste modo, porque a salvação ainda lhe é possível e, contrariamente à heresia pelagiana, só é possível pela graça; se o pecador não resistir a este apelo, será levado de graça em graça até a conversão. Deus, com efeito, disse: “Não quero a morte do ímpio, mas que se desvie de seu caminho e viva”. (Ez. XXXIII, 14-16). E São Paulo tem estas palavras: “Deus quer que todos os homens se salvem e atinjam o conhecimento da verdade”. (Tim. II, 4). Dizer, como Calvino, que Deus, por um decreto positivo predestina certos homens para a condenação eterna, recusando-lhe qualquer graça constitui outra heresia contrária à anterior. O Concílio de Trento manda-nos dizer o que dizia Santo Agostinho (Denz. 804): “Deus não manda o impossível, mas, ao dar-nos os seus preceitos, aconselha-nos a fazer o que podemos e a pedir-lhe a graça para cumprir o que não podemos”. Ora, o pecador endurecido tem ainda, enquanto viver na terra, a obrigação grave de fazer penitencia, impossível de cumprir sem a graça. Urge, pois, concluir que recebe de tempos em tempos as graças suficientes para começar a rezar.
Porém, se o pecador resiste a essas graças, começa a atolar-se, como quem se aventura na areia movediça. Quanto mais tenta desembaraçar-se mais os seus pés se afundam. A graça suficiente passa ainda, de tempos em tempos, como uma brisa, para lhe renovar as forças, mas se ele continua a resistir, ver-se-á privado da graça eficaz que acompanha a graça suficiente, como o fruto acompanha a flor. E depois, obterá ele mais tarde este socorro eficaz que toca o coração e converte verdadeiramente? As dificuldades aumentam, as forças da vontade declinam e as graças diminuem.
A impenitência temporal voluntária predispõe-nos manifestamente para a impenitência final, embora a misericórdia divina às vezes preserve desta, in extremis, muitos pecadores endurecidos.
 
 
A MORTE NA IMPENITÊNCIA
 
Pode morrer-se em pecado mortal, sem que se tenha apresentado ao espírito o pensamento de tal morte. Há muitos homens que morrem subitamente, sem se arrependerem dos pecados graves que tinham cometido. Costuma dizer-se que depois de terem abusado de muitas graças, foram surpreendidos pela morte. Nunca tiveram em conta os avisos recebidos. Nunca sentiram a contrição nem sequer a atrição dos pecados que, através do sacramento da penitencia, os teria justificado. Estas almas perderam-se para sempre. Verificou-se a impenitência final, sem recusa especial e prévia de se converterem no último momento.
Se, pelo contrário existiu tal recusa, trata-se de impenitência final aceite, querida, através da rejeição última da graça oferecida antes da morte pela misericórdia infinita. Trata-se de um pecado contra o Espírito Santo, que assume diferentes formas: o pecado pode ou recuar diante da humilhação da confissão dos pecados e preferir portanto a infelicidade pessoal, ou então chegar a desprezar explicitamente o seu dever de justiça ou de reparação para com Deus, recusando-lhe o amor que a Ele se deve como preceito supremo: “Amarás o Senhor teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças e com todo teu entendimento”. (Luc., X, 27). Lições tão terríveis como estas mostram nos a necessidade do arrependimento, diferente do remorso, que subsiste no inferno sem a menor atrição. Os condenados não se arrependem dos pecados, com ofensas feitas a Deus, mas porque foram punidos por causa desses pecados. Gostariam de não sofrer a pena que justamente lhes foi infligida e sentem-se roídos por um verme que nasce da podridão do pecado que não podem ver e que os torna descontentes com tudo e consigo mesmos. Judas sentiu remorso, que o lançou na angustia, mas não passou pelo arrependimento, que dá a paz; caiu no desespero, em vez de se confiar à infinita misericórdia e pedir perdão (8).
Constitui, portanto, um grave risco adiar-se a conversão para mais tarde. Monsanbré diz a este respeito (9): “Suprema lição de previdência: 1° Para aproveitar a última hora é necessário podê-la reconhecer. Ora, quando chega a última hora, tudo concorre, muitas vezes, para a dissimular ao pecador: as suas próprias ilusões, a covardia, a negligencia, a falta de sinceridade daqueles que o cercam; 2° Para aproveitar a última hora, no caso de se pressentir, seria preciso converter-se; ora, há grande probabilidade de o pecador não querer. A tirania do hábito marca os últimos desejos com o ferrete da irresolução. As dilações calculadas do pecador alteram a sua fé e tornam-no cego para ver o seu estado. A última hora aproxima-se sem que ele se mova e morre, de fato, impenitente. 3° Para aproveitar a última hora, se alguém quer converter-se, é preciso que a sua conversão seja verdadeira e, por isso, precisa da graça eficaz. Ora, o pecador retardatário nos seus cálculos, não tem em conta a graça, mas somente sua vontade. E se tem em conta a graça, faz tudo o que pode para a afastar no último momento, ao especular negligentemente com a misericórdia de Deus. E, então, alcançará ele o verdadeiro desgosto da ofensa feita a Deus, um verdadeiro e generoso arrependimento? O pecador retardatário já não sabe o que é a penitencia e corre grande risco de morrer no seu pecado. O que, portanto, há a fazer é assegurar desde já o benefício de uma verdadeira penitencia, não venha ela a faltar na altura em que se decide a nossa sorte para toda a eternidade” (10).
 
 
AS CONVERSÕES “IN EXTREMIS”
 
Os pecadores renitentes que, no último momento, imediatamente antes da separação da alma e do corpo, não dão mostras algumas de contrição, nem mesmo assim podem dizer-se definitivamente perdidos.
Só Deus pode saber se não se terão convertido à última hora. O Santo Cura d’Ars, divinamente inspirado, disse a uma viúva vinda pela primeira vez à sua igreja, debulhada em lágrimas: Senhora, a sua oração foi atendida. O seu  marido salvou-se. Acabava ele de lançar-se no Ródano, quando, segundos antes de sua morte, a Virgem lhe obteve a graça da conversão. Lembrai-vos que um mês antes, no vosso jardim, ele colheu a rosa mais bela e disse: “leva-a ao altar da Virgem. Ela não o esqueceu”.
Outras pessoas se converteram in extremis, as quais não se lembravam de ter feito nada, além da prática de qualquer ato religioso no decurso de sua vida; por exemplo, um marinheiro havia conservado o hábito de se descobrir, ao passar em frente de uma igreja; não sabia o Padre-Nosso nem a Ave-Maria, mas conservava ainda este laço que o impedia de se afastar definitivamente de Deus.
Lê-se na vida do santo bispo de Tulle, Bertau, amigo de Luís Veuillot, que uma pobre rapariga da cidade, antiga participante do coro na catedral, caiu na miséria e depois na imoralidade, como pecadora pública. Foi assassinada, uma noite, numa das ruas de Tulle. A polícia encontrou-a na agonia, à porta do hospital. Morreu com estas palavras na boca: “Jesus, Jesus”! perguntaram ao bispo: “Deverá fazer o funeral religioso?” Resposta dele: “Sim, porque morreu pronunciando o nome de Jesus. Mas enterrai-a de manhã, muito cedo e sem incenso”. No imundo quarto da infeliz encontraram o retrato do santo bispo de Tulle. Tinha escrito no verso: “O melhor dos pais”. Embora tivesse caído, reconhecera a santidade do seu bispo e conservava no coração a lembrança dos benefícios do Senhor.
Um escritor licencioso, Armando Silvestre, prometera a sua mãe, quando ela morreu, rezar todos os dias uma Ave-Maria. Naquele lamaçal, que era a vida do infeliz escritor, desabrochava todos os dias a flor da Ave-Maria. Adoeceu gravemente com uma pneumonia. Levaram-no para um hospital de Paris, servido por religiosos. Perguntaram-lhe eles: “Quereis um sacerdote?” – “Sim” – respondeu. E recebeu a absolvição, provavelmente com uma atrição suficiente, devido a uma graça especial que devia ter obtido da Virgem. É provável que tenha entrado logo a seguir num longo e penosíssimo purgatório.
Outro escritor francês, Adolphe Retté, pouco depois da conversão, sincera e profunda, ficou impressionado por ver em um escapulário esta legenda: “Rezai por aqueles que vão morrer durante a Missa que ides assistir”. Fê-lo de bom grado. Alguns dias depois, adoeceu gravemente. Ficou imobilizado em um leito do hospital de Beaune, muitos anos, até a morte. Todas as manhãs oferecia seus sofrimentos pelos que iam morrer nesse dia; obteve muitas conversões in extremis. Ao chegar ao céu, havemos de conhecer o número dessas conversões. E cantaremos a misericórdia de Deus eternamente.
Conta-se na vida de Santa Catarina de Sena, a conversão in extremis de dois grandes criminosos. A santa tinha ido visitar uma amiga. Ouvira-se na rua onde esta morava um grande ruído. A amiga de Catarina olhou pela janela e viu que se tratava de dois condenados à morte, conduzidos em uma carroça ao derradeiro suplício. Como os atormentavam com tenazes aquecidas ao rubro, blasfemavam e soltavam horrorosos gritos de raiva. Catarina põe-se, ali mesmo, imediatamente de joelhos e reza com os braços em cruz, pela conversão dos dois criminosos.
Eis senão quando, na rua, cessaram as blasfémias e os criminosos manifestaram o desejo de se confessarem. As pessoas presentes ficaram espantadas com tão súbita mudança; ignoravam que uma santa tinha rezado para obter a dupla conversão.
Há cerca de sessenta anos, o capelão da prisão de Nancy, que até ali tinha conseguido converter todos os criminosos que acompanhava à guilhotina, encontrava-se em um carro celular com um assassino apostado em não se confessar antes de morrer. A viatura passa em frente de um santuário de Nossa Senhora do Socorro. Então, o velho capelão diz: “Lembrai-Vos, ó piedosa e dulcíssima Virgem Maria que nunca se ouviu dizer que algum daqueles que têm recorrido à Vossa proteção fosse por Vós desamparado. Convertei este criminoso, senão direi que se ouviu dizer que não nos atendestes”. E o criminoso converteu-se imediatamente.
A conversão é sempre possível até a morte, mas torna-se cada vez mais difícil à medida que aumenta a obstinação. Sendo assim, o melhor é não adiar nunca a conversão e pedir todos os dias, por meio da Ave-Maria, a graça de uma boa morte.
 
Notas:
1 – III, q. 84, a. 5 e 85.
2 – Avent de Saint Germain et Défense de la Tradition, I. XI, c. IV, V, VI, VII, VIII.
3 – II, II, 1. 14.
4 – I, II, q. 109, a. 8.
5 – Cfr. Santo Tomás, I, II, q. 76-78; II, II, q. 15, a. 1; Dic. Teol. Catol., art. Impenitencia. c.1283.
6 – Na vida de são João Bosco, vêmo-lo aproximar se do leito de um moribundo, maçon inveterado. Este diz-lhe: “Não venha me falar de religião; senão, eis um revolver com uma bala para ti e outra para mim”. Nessa altura – Diz Dom Bosco – falemos de outra coisa. E passou a falar-lhe da vida de Voltaire. Já quase no fim, diz: “Há quem afirme que Voltaire não se arrependeu e teve uma morte má. Eu não digo nada porque não sei”. – Então o maçon inquiriu: “Até Voltaire pôde arrepender-se?” – “Sim” – “Nesse caso, também eu poderia arrepender-me ainda?” E aquele homem, que estava desesperado, parece ter tido uma boa morte. – Cita-se o caso de um capelão de prisão, santo sacerdote, que, ao assistir a um criminoso que não queria confessar-se antes de morrer, acabou por lhe dizer: “Bem! Se queres perder, perde-te”. Tratou-se da beatificação deste capelão, mas não pôde ser beatificado por ter dito aquilo. Devia, até ao último momento ter falado da misericórdia e da possibilidade da conversão a Deus.
7 – Cfr Santo Ambrósio, De Penitentia, c. X-XII; São Jerônimo, Epist. 147 ad Sabinianum; Santo Agostinho, Sermões, 351 – 352, Da utilidade de fazer penitencia; São João Crisóstomo, 9 Homilias sobre a penitencia, P. G. t. XLIX, col. 277 e segs.; São Bernardo, De conversione ad clericos; Bossuet, Sermão para o primeiro domingo do Advento.
8 – Cfr. Santo Tomás, II, II, q. 13, a. 4; III, q. 86, a. 1; C. Gentiles, l. IV, c. 89.
9 – Retiros pascais em Notre-Dame, instrução 3°.
10 – Não se esqueça que a atrição, que dispões a receber bem o sacramento da penitencia e leva a justificação deve ser sobrenatural. Segundo o Concílio de Trento, ela pressupõe a graça da fé e da esperança e deve detestar o pecado como ofensa feita a Deus (Denz., 798). Ora isto supõe, provavelmente, como o batismo dos adultos, um amor inicial a Deus, fonte de toda justiça (Denz., 798). Com efeito, não podemos detestar a mentira sem amar a verdade nem detestar a injustiça sem começar a amar a justiça e aquele que é fonte de toda a justiça.