18.5.6 - O DESEJO DA MORTE

18.5.6 - O DESEJO DA MORTE

 

Os perfeitíssimos não temem a morte; até a desejam. Desprezam o próprio corpo, fazem-lhe guerra, renunciam ao natural cuidado com ele; têm pouco amor à vida física e muito amor por mim. Eles suspiram pela morte, dizendo: "Quem me separará deste corpo (Rm 7,24)? "Desejo partir e ir estar com Cristo" (Fl 1,23). Ou então: "A morte é minha aspiração e, a vida, eu a suporto com paciência" (Fl 1,21; Rm 8,23). Sublimada na união, a alma deseja ver-me e glorificar-me. Quando volta a si, readquirindo suas sensações, fica impaciente fora do êxtase, distante da convivência com os santos que me glorificam, em meio a pecadores que tanto me ofendem. A pessoa retorna às sensações corporais, porque antes elas haviam sido arrebatadas no ímpeto do amor, quando o espírito se vê mais unido a mim que ao corpo.

 

Disse que o corpo não aguenta uma união extática contínua. Por esta razão afasto-me da pessoa. Ela não perde a graça; continua a sentir as consolações sensíveis e espirituais, o que não acontecia no segundo e terceiro estados. Agora retiro-me somente quanto à união; mas volto depois com maior intensidade de graça e união, com maior conhecimento da minha verdade, que se revela à pessoa. É justamente quando me afasto para que o corpo volte ao seu normal, que o perfeitíssimo sentirá a impaciência. Ao ver os pecados que me ofendem, sua dor é cruel. Por tal motivo e pelo desejo de rever-me, a vida lhe parece insuportável. Mas como sua vontade se identificou com a minha, conforma-se ao que desejo. Embora suspirando por mim, permanece no corpo ao mesmo tempo alegre e sofredor, porque tal é a minha vontade. Tudo aceita por minha glória e pela salvação dos homens. Com tal modo de se comportar, em nada se afasta de mim. Inflamados de amor, transformados em Cristo crucificado, correm céleres pela porta-mensagem do meu Filho, alegres nos sofrimento e dificuldades.

 

Equilibram-se neles a alegria e a dor: tanto se rejubilam quanto sofrem! A presença de grandes lutas constitui até um lenitivo para o desejo de morrer. Realmente, muitas vezes a vontade de sofrer mitiga a dor proveniente da espera da morte. Estes, que estão no quarto estado, além de tolerar os sofrimentos com paciência - como ocorria no terceiro estado - alegram-se nas contradições. Se sofrem, ficam contentes; se não sofrem, ficam tristes. Neste último caso, temem que eu os esteja recompensando nesta vida por suas boas obras ou que não me seja agradável o ímpeto de seus desejos. Rejubilam se quando permito grandes dificuldades, pois acreditam-se participantes dos sofrimentos de Cristo. Caso lhes fosse permitido praticar as virtudes na tranquilidade, não o aceitariam; acham melhor alegrar-se na cruz com Cristo, adquirir as virtudes na luta, do que alcançar o céu por outras formas. Por que razão? Por que se afogaram no sangue e nele acharam o amor, essa chama que procede mim e que arrebata o coração e espírito no sacrifício dos desejos. Eleva-se a inteligência na contemplação da minha divindade, a vontade a segue, alimenta-se de mim, une-se a mim. É o conhecimento infuso, que concedo àqueles que realmente me amam e servem.

 

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