Quanto esta reflexão me fez sofrer, só Nosso Senhor pode
	saber, porque só Ele pode penetrar o nosso íntimo. Comecei, então, a duvidar se as manifestações seriam do Demónio que procurava, por esse meio, perder-me. E, como tinha ouvido dizer que o
	Demónio trazia sempre a guerra e a desordem, comecei a pensar
	que, na verdade, desde que via estas coisas, não tinha tido mais
	alegria nem bem-estar em nossa casa. Que angústia que eu sentia! Manifestei a meus primos a minha dúvida. A Jacinta respondeu:
	– Não é o Demónio, não! O Demónio dizem que é muito feio e
	que está debaixo da terra, no inferno; e aquela Senhora é tão bonita! E nós vimo-La subir ao Céu.
	Nosso Senhor serviu-se disto para desvanecer algo a minha
	dúvida. Mas, no decurso deste mês, perdi o entusiasmo pela prática do sacrifício e da mortificação e titubeava se acabaria por dizer
	que tinha mentido e assim acabar com tudo. A Jacinta e o Francisco diziam-me:
	– Não faças isso! Não vês que agora é que tu vais mentir e
	que mentir é pecado?
	Em este estado tive um sonho que veio aumentar as trevas do
	meu espírito: Vi o Demónio que, rindo-se de me ter enganado, fazia esforços por me arrastar para o inferno. Ao ver-me nas suas
	garras, comecei a gritar em tal forma, chamando por Nossa Senhora, que acordei minha mãe, a qual me chamou, aflita, perguntando-me o que eu tinha. Não me lembro do que Ihe respondi. O
	que me lembro é que em aquela noite não pude mais dormir, pois
	fiquei tolhida de medo. Este sonho deixou no meu espírito uma
	nuvem de verdadeiro medo e aflição. O meu único alívio era ver-
	-me só, em algum canto solitário, para aí chorar à minha vontade.
	Comecei por sentir aborrecimento até à companhia de meus pri-
	mos e por isso comecei a esconder-me também deles. Pobres
	crianças! Às vezes andavam à minha procura, chamando pelo meu
	nome, e eu junto deles sem Ihes responder, oculta, às vezes, em
	algum canto para onde eles não atinavam a olhar.
	Aproximava-se o dia 13 de Julho e eu duvidava se lá iria. Pensava: se é o Demónio, para que hei-de ir vê-lo? Se me perguntam por
	que não vou, digo que tenho medo que seja o Demónio quem nos
	aparece e que por isso não vou. A Jacinta e o Francisco que façam
	como quiserem; eu não volto mais à Cova de Iria. A resolução estava tomada e eu bem resolvida a pô-la em prática.
	No dia 12, pela tarde, começou a juntar-se o povo que vinha
	para assistir aos acontecimentos do dia seguinte. Chamei então a
	Jacinta e o Francisco e informei-os da minha resolução. Eles responderam-me:
	– Nós vamos. Aquela Senhora mandou-nos lá ir.
	A Jacinta prontificou-se a falar ela com a Senhora, mas custava-lhe que eu não fosse e começou a chorar. Perguntei-lhe por
	que chorava.
	– Por tu não quereres ir.
	– Não; eu não vou. Olha: se a Senhora te perguntar por mim,
	diz-lhe que não vou, porque tenho medo que seja o demónio.
	E deixei-os ficar, para me ir esconder e não ter assim, que
	falar às pessoas que me procuravam para me interrogar. Minha
	mãe, que me julgava a brincar com as crianças do lugar, durante
	todo este tempo que passava escondida atrás dum silvado que
	havia na propriedade dum vizinho que pegava com o nosso Arneiro,
	um pouco a leste do poço já várias vezes mencionado, quando eu
	à noite chegava a casa, (minha mãe) repreendia-me, dizendo:
	– Isto é que é um santinha de pau carunchento! Todo o tempo
	que Ihe sobra de andar com as ovelhas passa-o na brincadeira; e
	de tal forma que ninguém a encontra!
	No dia seguinte, ao aproximar-se a hora em que devia partir,
	senti-me de repente impelida a ir, por uma força estranha, a que
	não me era fácil resistir. Pus-me, então, a caminho e passei por
	casa de meus tios a ver se ainda lá estava a Jacinta. Encontrei-a
	no quarto, com seu irmãozinho Francisco, de joelhos ao pé da cama,
	chorando.
	– Então vocês não vão? – Ihes perguntei.
	– Sem ti não nos atrevemos a ir. Anda, vem.
	– Já cá vou – Ihes respondi.
	Então, com um semblante já alegre, partiram comigo. O povo
	esperava-nos em massa pelos caminhos e a custo conseguimos lá
	chegar. Foi este o dia em que a SS. Virgem se dignou revelar-nos o
	segredo. Depois, para reanimar o meu fervor decaído, disse-me:
	– Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei a Jesus, muitas vezes, em especial sempre que fizerdes algum sacrifício: Ó Jesus, é
	por Vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação
	pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria.
		Quanto esta reflexão me fez sofrer, só Nosso Senhor pode
	
		saber, porque só Ele pode penetrar o nosso íntimo. Comecei, então, a duvidar se as manifestações seriam do Demónio que procurava, por esse meio, perder-me. E, como tinha ouvido dizer que o
	
		Demónio trazia sempre a guerra e a desordem, comecei a pensar
	
		que, na verdade, desde que via estas coisas, não tinha tido mais
	
		alegria nem bem-estar em nossa casa. Que angústia que eu sentia! Manifestei a meus primos a minha dúvida. A Jacinta respondeu:
	
		– Não é o Demónio, não! O Demónio dizem que é muito feio e
	
		que está debaixo da terra, no inferno; e aquela Senhora é tão bonita! E nós vimo-La subir ao Céu.
	
		Nosso Senhor serviu-se disto para desvanecer algo a minha
	
		dúvida. Mas, no decurso deste mês, perdi o entusiasmo pela prática do sacrifício e da mortificação e titubeava se acabaria por dizer
	
		que tinha mentido e assim acabar com tudo. A Jacinta e o Francisco diziam-me:
	
		– Não faças isso! Não vês que agora é que tu vais mentir e
	
		que mentir é pecado?
	
		Em este estado tive um sonho que veio aumentar as trevas do
	
		meu espírito: Vi o Demónio que, rindo-se de me ter enganado, fazia esforços por me arrastar para o inferno. Ao ver-me nas suas
	
		garras, comecei a gritar em tal forma, chamando por Nossa Senhora, que acordei minha mãe, a qual me chamou, aflita, perguntando-me o que eu tinha. Não me lembro do que Ihe respondi. O
	
		que me lembro é que em aquela noite não pude mais dormir, pois
	
		fiquei tolhida de medo. Este sonho deixou no meu espírito uma
	
		nuvem de verdadeiro medo e aflição. O meu único alívio era ver-
	
		-me só, em algum canto solitário, para aí chorar à minha vontade.
	
		Comecei por sentir aborrecimento até à companhia de meus pri-
	
		mos e por isso comecei a esconder-me também deles. Pobres
	
		crianças! Às vezes andavam à minha procura, chamando pelo meu
	
		nome, e eu junto deles sem Ihes responder, oculta, às vezes, em
	
		algum canto para onde eles não atinavam a olhar.
	
		Aproximava-se o dia 13 de Julho e eu duvidava se lá iria. Pensava: se é o Demónio, para que hei-de ir vê-lo? Se me perguntam por
	
		que não vou, digo que tenho medo que seja o Demónio quem nos
	
		aparece e que por isso não vou. A Jacinta e o Francisco que façam
	
		como quiserem; eu não volto mais à Cova de Iria. A resolução estava tomada e eu bem resolvida a pô-la em prática.
	
		No dia 12, pela tarde, começou a juntar-se o povo que vinha
	
		para assistir aos acontecimentos do dia seguinte. Chamei então a
	
		Jacinta e o Francisco e informei-os da minha resolução. Eles responderam-me:
	
		– Nós vamos. Aquela Senhora mandou-nos lá ir.
	
		A Jacinta prontificou-se a falar ela com a Senhora, mas custava-lhe que eu não fosse e começou a chorar. Perguntei-lhe por
	
		que chorava.
	
		– Por tu não quereres ir.
	
		– Não; eu não vou. Olha: se a Senhora te perguntar por mim,
	
		diz-lhe que não vou, porque tenho medo que seja o demónio.
	
		E deixei-os ficar, para me ir esconder e não ter assim, que
	
		falar às pessoas que me procuravam para me interrogar. Minha
	
		mãe, que me julgava a brincar com as crianças do lugar, durante
	
		todo este tempo que passava escondida atrás dum silvado que
	
		havia na propriedade dum vizinho que pegava com o nosso Arneiro,
	
		um pouco a leste do poço já várias vezes mencionado, quando eu
	
		à noite chegava a casa, (minha mãe) repreendia-me, dizendo:
	
		– Isto é que é um santinha de pau carunchento! Todo o tempo
	
		que Ihe sobra de andar com as ovelhas passa-o na brincadeira; e
	
		de tal forma que ninguém a encontra!
	
		No dia seguinte, ao aproximar-se a hora em que devia partir,
	
		senti-me de repente impelida a ir, por uma força estranha, a que
	
		não me era fácil resistir. Pus-me, então, a caminho e passei por
	
		casa de meus tios a ver se ainda lá estava a Jacinta. Encontrei-a
	
		no quarto, com seu irmãozinho Francisco, de joelhos ao pé da cama,
	
		chorando.
	
		– Então vocês não vão? – Ihes perguntei.
	
		– Sem ti não nos atrevemos a ir. Anda, vem.
	
		– Já cá vou – Ihes respondi.
	
		Então, com um semblante já alegre, partiram comigo. O povo
	
		esperava-nos em massa pelos caminhos e a custo conseguimos lá
	
		chegar. Foi este o dia em que a SS. Virgem se dignou revelar-nos o
	
		segredo. Depois, para reanimar o meu fervor decaído, disse-me:
	
		– Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei a Jesus, muitas vezes, em especial sempre que fizerdes algum sacrifício: Ó Jesus, é
	
		por Vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação
	
		pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria.
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