A IGREJA E A INSTRUÇÃO DOS POBRES

A IGREJA E A INSTRUÇÃO DOS POBRES

68. Dirigindo-se a alguns educadores, o Papa Francisco recordava que a educação sempre foi uma das expressões mais altas da caridade cristã: «A vossa é uma missão cheia de obstáculos, mas também de alegrias […]. Uma missão de amor, porque não se pode ensinar sem amar». Neste sentido, desde os primeiros tempos, os cristãos compreenderam que o saber liberta, dignifica e aproxima da verdade. Ensinar os pobres era, para a Igreja, um ato de justiça e fé. Inspirada no exemplo do Mestre que ensinava ao povo as verdades divinas e humanas, a Igreja assumiu como missão formar as crianças e os jovens, especialmente os mais pobres, na verdade e no amor. Essa missão ganhou corpo com a fundação de Congregações voltadas à educação popular.

 

69. No final do século XVI, São José de Calasanz, impressionado pela falta de instrução e formação dos jovens pobres da cidade de Roma, deu vida à primeira escola pública popular e gratuita da Europa, em algumas salas contíguas à Igreja de Santa Dorotéia, no bairro Trastevere. Era a semente da qual nasceria e se desenvolveria, não sem dificuldades, a Ordem dos Clérigos Regulares Pobres da Madre de Deus das Escolas Pias – cujos membros são mais conhecidos como Padres Escolápios –, com o objetivo de transmitir aos jovens «além da ciência profana, também a sabedoria do Evangelho, ensinando-lhes a captar, nas vicissitudes pessoais e na história, a ação amorosa de Deus Criador e Redentor». Com efeito, podemos considerar este corajoso sacerdote como «o verdadeiro fundador da moderna escola católica, que visa a formação integral do homem e está aberta a todos». Animado pela mesma sensibilidade, no século XVII, São João Batista de La Salle, percebendo a injustiça causada pela exclusão dos filhos dos operários e camponeses do sistema educacional da França do seu tempo, fundou os Irmãos das Escolas Cristãs, com o ideal de lhes oferecer ensino gratuito, formação sólida e ambiente fraterno. La Salle via na sala de aula um espaço de promoção humana, mas também de conversão. Os seus colégios uniam oração, método, disciplina e partilha. Cada criança era considerada um dom único de Deus, e o ato de ensinar, um serviço ao Reino de Deus.

 

70. Já no século XIX, também na França, São Marcelino Champagnat funda o Instituto dos Irmãos Maristas das Escolas, «sensível às necessidades espirituais e educativas da sua época, sobretudo a ignorância religiosa e as situações de abandono vividas em particular pela juventude», dedicando-se com todo o afinco, num período em que o acesso à educação continuava a ser um privilégio de poucos, à missão de educar e evangelizar crianças e jovens, especialmente os mais necessitados. Com o mesmo espírito, na Itália, São João Bosco iniciou a grande obra Salesiana, fundamentada sobre os três princípios do “Método preventivo” – razão, religião e amabilidade – e o Beato António Rosmini fundou o Instituto da Caridade, no qual a “caridade intelectual” – junto à “material” e tendo como ápice a “espiritual-pastoral” –, era apresentada como dimensão indispensável para qualquer ação caritativa que buscasse o bem e o desenvolvimento integral da pessoa.

 

71. Muitas Congregações femininas também foram protagonistas dessa revolução pedagógica. As Ursulinas, a Ordem da Companhia de Maria Nossa Senhora, as Mestras Pias e tantas outras, fundadas especialmente no século XVIII e XIX, ocuparam espaços onde o Estado era ausente. Criaram escolas nos pequenos vilarejos, nas zonas de periferia e nos bairros operários. A educação das meninas, em especial, tornou-se prioridade. As religiosas alfabetizavam, evangelizavam, tratavam das questões práticas da vida quotidiana, elevavam o espírito através do cultivo das artes e, sobretudo, formavam consciências. A pedagogia era simples: proximidade, paciência, doçura. Ensinavam com a vida, antes das palavras. Em tempos de analfabetismo generalizado e exclusão estrutural, essas mulheres consagradas foram faróis de esperança. A sua missão era formar o coração, ensinar a pensar, fazer florescer a dignidade. Unindo vida de piedade e dedicação ao próximo, resistiam ao abandono com a ternura de quem educa em nome de Cristo.

 

72. A educação dos pobres, para a fé cristã, não é um favor, mas um dever. Os pequenos têm direito à sabedoria, como exigência básica do reconhecimento da dignidade humana. Ensinar-lhes é reconhecer o seu valor, dando-lhes instrumentos para transformar a sua realidade. A tradição cristã entende que o saber é dom de Deus e responsabilidade comunitária. O ensino cristão forma não apenas profissionais, mas pessoas abertas ao bem, ao belo e à verdade. Sendo assim, a escola católica, quando fiel ao seu nome, torna-se espaço de inclusão, de formação integral e de promoção humana; conjugando fé e cultura, semeia-se futuro, honra-se a imagem de Deus e constrói-se uma sociedade melhor.

 

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