A PROFECIA DA CONTEMPLAÇÃO

A PROFECIA DA CONTEMPLAÇÃO

53. Muitas vezes deixamos que a consciência se torne insensível, porque «a constante distração nos tira a coragem de advertir a realidade dum mundo limitado e finito». Se nos detivermos na superfície, pode parecer «que as coisas não estejam assim tão graves e que o planeta poderia subsistir ainda por muito tempo nas condições atuais. Este comportamento evasivo serve-nos para mantermos os nossos estilos de vida, de produção e consumo. É a forma como o ser humano se organiza para alimentar todos os vícios autodestrutivos: tenta não os ver, luta para não os reconhecer, adia as decisões importantes, age como se nada tivesse acontecido»-

 

54. Além de tudo isso, quero lembrar que cada uma das diferentes espécies tem valor em si mesma. Ora, «anualmente, desaparecem milhares de espécies vegetais e animais, que já não poderemos conhecer, que os nossos filhos não poderão ver, perdidas para sempre. A grande maioria delas extingue-se por razões que têm a ver com alguma atividade humana. Por nossa causa, milhares de espécies já não darão glória a Deus com a sua existência, nem poderão comunicar-nos a sua própria mensagem. Não temos direito de o fazer».

 

55. Aprendendo com os povos nativos, podemos contemplar a Amazónia, e não apenas analisá-la, para reconhecer esse precioso mistério que nos supera; podemos amá-la, e não apenas usá-la, para que o amor desperte um interesse profundo e sincero; mais ainda, podemos sentir-nos intimamente unidos a ela, e não só defendê-la: e então a Amazónia tornar-se-á nossa como uma mãe. Porque se «contempla o mundo, não como alguém que está fora dele, mas dentro, reconhecendo os laços com que o Pai nos uniu a todos os seres».

 

56. Despertemos o sentido estético e contemplativo que Deus colocou em nós e que, às vezes, deixamos atrofiar. Lembremo-nos de que, «quando não se aprende a parar a fim de admirar e apreciar o que é belo, não surpreende que tudo se transforme em objeto de uso e abuso sem escrúpulos». Pelo contrário, se entrarmos em comunhão com a floresta, facilmente a nossa voz se unirá à dela e transformar-se-á em oração: «Deitados à sombra dum velho eucalipto, a nossa oração de luz mergulha no canto da folhagem eterna». Tal conversão interior é que nos permitirá chorar pela Amazónia e gritar com ela diante do Senhor.

 

57. Jesus disse: «Não se vendem cinco passarinhos por duas pequeninas moedas? Contudo, nenhum deles passa despercebido diante de Deus» (Lc 12, 6). Deus Pai, que criou com infinito amor cada ser do universo, chama-nos a ser seus instrumentos para escutar o grito da Amazónia. Se acudirmos a este clamor angustiado, tornar-se-á manifesto que as criaturas da Amazónia não foram esquecidas pelo Pai do céu. Segundo os cristãos, o próprio Jesus nos chama a partir delas, «porque o Ressuscitado as envolve misteriosamente e guia para um destino de plenitude. As próprias flores do campo e as aves que Ele, admirado, contemplou com os seus olhos humanos, agora estão cheias da sua presença luminosa». Por todas estas razões, nós, os crentes, encontramos na Amazónia um lugar teológico, um espaço onde o próprio Deus Se manifesta e chama os seus filhos.

 

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