A VENERAÇÃO DA SUA IMAGEM

A VENERAÇÃO DA SUA IMAGEM

52. Convém notar que a imagem de Cristo com o seu coração, ainda que de maneira nenhuma possa ser objeto de adoração, não é uma imagem qualquer, entre muitas outras que poderíamos escolher. Não é algo inventado de modo abstrato ou desenhado por um artista, «não é um símbolo imaginário, é um símbolo real, que representa o centro, a fonte da qual brotou a salvação para a humanidade inteira».

 

53. Há uma experiência humana universal que torna esta imagem única. Pois não há dúvida que, ao longo da história e em várias partes do mundo, o coração se tenha tornado um símbolo da intimidade mais pessoal e também do afeto, emoções e capacidade de amar. Para além de qualquer explicação científica, uma mão colocada sobre o coração de um amigo exprime um afeto especial; quando uma pessoa se apaixona e está perto da pessoa amada, o batimento cardíaco acelera; quando alguém sofre um abandono ou uma desilusão por parte da pessoa amada, sente uma espécie de forte opressão no coração.Por outro lado, para exprimir que algo é sincero, que vem realmente do centro da pessoa, afirma-se: “Digo-o do fundo do coração”. A linguagem poética não pode ignorar a força destas experiências. Por isso, é inevitável que, ao longo da história, o coração tenha alcançado uma força simbólica única, que não é meramente convencional.

 

54. É, pois, compreensível que a Igreja tenha escolhido a imagem do coração para representar o amor humano e divino de Jesus Cristo e o núcleo mais íntimo da sua Pessoa. Mas, se a imagem de um coração com chamas de fogo pode ser um símbolo eloquente que nos recorda o amor de Jesus Cristo, é conveniente que esse coração faça parte de uma imagem de Jesus Cristo.Isto torna ainda mais significativo o seu apelo a uma relação pessoal de encontro e de diálogo. Essa imagem venerada de Cristo, onde se destaca o seu coração amoroso, tem ao mesmo tempo um olhar que apela ao encontro, ao diálogo e à confiança; tem mãos fortes capazes de nos sustentar; tem uma boca que nos fala de uma forma única e personalíssima.

 

55. O coração tem o valor de ser percebido não como um órgão separado, mas como um centro íntimo que gera unidade e, ao mesmo tempo, como expressão da totalidade da pessoa, o que não acontece com outros órgãos do corpo humano. Se é o centro íntimo da totalidade da pessoa e, portanto, uma parte que representa o todo, poderíamos facilmente desnaturalizá-lo caso o contemplássemos separado da figura do Senhor. A imagem do coração deve remeter-nos para a totalidade de Jesus Cristo no seu centro unificador e, a partir desse, simultaneamente deve levar-nos a contemplar Cristo em toda a beleza e riqueza da sua humanidade e da sua divindade.

 

56. Isto vai além da atração que podem gerar as várias imagens do Coração de Cristo, pois não é que, diante das imagens de Cristo, «se deva pedir alguma coisa a essas imagens ou depositar confiança nelas como antigamente faziam os pagãos», mas que «por meio das imagens que beijamos e diante das quais nos descobrimos e prostramos, adoramos a Cristo».

 

57. Além disso, algumas destas imagens podem parecer-nos pouco atrativas e não nos mover muito ao amor e à oração. Isso é secundário, pois a imagem não é mais do que uma figura motivadora, e, como diriam os orientais, não devemos fixar-nos no dedo que aponta para a lua. Enquanto a Eucaristia é presença real a ser adorada, neste caso trata-se apenas de uma imagem que, embora tenha sido abençoada, nos convida a ir além dela, nos orienta a elevar e unir o nosso próprio coração ao de Cristo vivo. A imagem venerada convoca, aponta, conduz, a fim de dedicarmos tempo ao encontro com Cristo e à sua adoração, conforme nos pareça melhor imaginá-Lo. Assim, olhando a imagem, estamos diante de Cristo, e diante d’Ele «o amor se detém, contempla o mistério, desfruta dele em silêncio».

 

58. Dito tudo isto, não devemos esquecer que esta imagem do coração nos fala de carne humana, da terra, e por isso nos fala também de Deus que quis entrar na nossa condição histórica, fazer-se história e partilhar o nosso caminho terreno. Uma forma de devoção mais abstrata ou estilizada não será necessariamente mais fiel ao Evangelho, porque neste sinal sensível e acessível se manifesta o modo como Deus quis revelar-se e tornar-se próximo de nós.

 

 

 

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