A VIDA CRISTÃ E ECUMÉNICA

A VIDA CRISTÃ E ECUMÉNICA

11. Foi neste contexto constrangedor, instável e actualmente propenso à violência, que Deus permitiu o florescimento da sua Igreja. Esta vive numa notável variedade de formas. A par da Igreja Católica, estão presentes no Médio Oriente numerosas e veneráveis Igrejas, às quais se vieram juntar comunidades eclesiais de origem mais recente. Este mosaico exige um esforço considerável e constante para favorecer a unidade no respeito das riquezas próprias, a fim de reforçar a credibilidade do anúncio do Evangelho e o testemunho cristão. A unidade é um dom de Deus, que nasce do Espírito e que é preciso fazer crescer com paciente perseverança (cf. 1 Pd 3, 8-9). Como sabemos, quando as divisões nos contrapõem, a tentação é fazer apelo simplesmente a critérios humanos, esquecendo os sábios conselhos de São Paulo (cf. 1 Cor 6, 7-8). Ele exorta: « Esforçai- -vos por manter a unidade do Espírito, mediante o vínculo da paz » (Ef 4, 3). O centro e o fruto do verdadeiro ecumenismo é a fé. Esta precisamos de começar a aprofundar. A unidade brota da oração perseverante e da conversão, que leva cada um a viver de acordo com a verdade e na caridade (cf. Ef 4, 15-16). O Concílio Vaticano II encorajou este « ecumenismo espiritual », que é a alma do verdadeiro ecumenismo. A própria situação do Médio Oriente é um apelo premente à santidade de vida. Os martirológios atestam como santos e mártires oriundos das diversas realidades eclesiais foram – e são-no ainda alguns hoje – testemunhas vivas desta unidade sem fronteiras em Cristo glorioso, antecipação daquele « reunirmo-nos » como povo finalmente reconciliado n’Ele.[9] Por isso, no próprio seio da Igreja Católica, é preciso consolidar a comunhão que dá testemunho do amor de Cristo.

 

12. Com base nas indicações do Directório Ecuménico, os fiéis católicos podem promover o ecumenismo espiritual nas paróquias, mosteiros e conventos, nas escolas e universidades, e nos seminários. Os pastores terão o cuidado de educar os fiéis para serem testemunhas da comunhão em todos os âmbitos da sua vida. Esta comunhão, porém, não significa sincretismo. O testemunho autêntico requer o reconhecimento e o respeito pelo outro, a disponibilidade ao diálogo na verdade, a paciência como uma dimensão do amor, a simplicidade e a humildade de quem se reconhece pecador diante de Deus e do próximo, a capacidade de perdão, reconciliação e purificação da memória, a nível pessoal e comunitário.

 

13. Encorajo a obra dos teólogos que incansavelmente trabalham pela unidade e alegro-me com as iniciativas das comissões ecuménicas locais que existem a diversos níveis, e também com a acção de diversas comunidades que rezam e actuam em prol da tão almejada unidade, promovendo a amizade e a fraternidade. Na fidelidade às origens da Igreja e às suas tradições vivas, é importante igualmente que se pronunciem em uníssono sobre as grandes questões morais que se levantam a propósito da verdade da pessoa humana, da família, da sexualidade, da bioética, da liberdade, da justiça e da paz.

 

14. Além disso, nos campos caritativo e educativo, já existe um « ecumenismo de serviço » entre os cristãos das diversas Igrejas e membros das Comunidades eclesiais. O Conselho das Igrejas do Médio Oriente, que reúne as Igrejas das diversas tradições cristãs presentes na região, constitui o espaço propício para um diálogo que se há-de desenvolver no amor e no respeito recíproco.

 

15. O Concílio Vaticano II indica que o caminho ecuménico se torna eficaz « sobretudo pela oração e pelo exemplo de vida, pela fidelidade religiosa para com as antigas tradições orientais, pelo melhor conhecimento mútuo, pela colaboração e estima fraterna das instituições e das mentalidades ». Convinha principalmente que todos se voltassem ainda mais para o próprio Cristo. O divino Mestre une aqueles que acreditam n’Ele e O amam, concedendo-lhes o Espírito de seu Pai e também Maria, sua Mãe (cf. Jo 14, 26; 16, 7; 19, 27). Embora de nível diverso, este duplo dom pode ser de notável ajuda e merece uma atenção maior da parte de todos.

 

16. O amor comum a Cristo, que « não cometeu pecado, nem na sua boca se encontrou engano » (1 Pd 2, 22), e os vínculos que « unem intimamente » as Igrejas Orientais que não estão em plena comunhão com a Igreja Católica, impelem-nos ao diálogo e à unidade. Em diversos casos, os católicos estão ligados, por origens religiosas comuns, às Igrejas do Oriente que não estão em plena comunhão. Para uma renovada pastoral ecuménica visando um testemunho comum, há que entender bem a abertura conciliar para uma certa communicatio in sacris nos sacramentos da Penitência, da Eucaristia e da Unção dos Enfermos, que não só é possível, mas pode mesmo ser recomendável nalgumas circunstâncias favoráveis, de acordo com normas claras e com a aprovação das autoridades eclesiásticas. Os matrimónios entre fiéis católicos e ortodoxos são numerosos e requerem uma atenção ecuménica especial. Encorajo os Bispos e os Eparcas a aplicarem, na medida do possível e onde existirem, os acordos pastorais para promover gradualmente uma pastoral ecuménica de conjunto.

 

17. A unidade ecuménica não é uniformidade de tradições e celebrações. Mas, estou certo de que será possível, com a ajuda de Deus, começar por acordar-se sobre uma tradução comum da Oração do Senhor, o Pai Nosso, nas línguas vernáculas da região, onde houver necessidade. Ao rezarem juntos com as mesmas palavras, os cristãos reconhecerão o seu enraizamento comum na única fé apostólica, sobre a qual assenta a busca da plena comunhão. Além disso, o aprofundamento comum do estudo dos Padres orientais e latinos, bem como das respectivas tradições espirituais poderia contribuir notavelmente para a plena comunhão na correcta aplicação das normas canónicas que regulam esta matéria.

 

18. Convido os católicos do Médio Oriente a cultivarem as relações com os fiéis das diversas Comunidades eclesiais presentes na região. São possíveis várias iniciativas conjuntas: por exemplo, uma leitura em conjunto da Bíblia e também a sua difusão poderiam ser o início deste percurso; além disso há colaborações particularmente fecundas no âmbito das actividades caritativas e da promoção dos valores da vida humana, da justiça e da paz que se poderiam desenvolver ou consolidar. Tudo isto contribuirá para um melhor conhecimento recíproco e a criação dum clima de estima, que são condições indispensáveis para promover a fraternidade.

 

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