JESUS, O MESSIAS POBRE

JESUS, O MESSIAS POBRE

18. Toda a história do Antigo Testamento sobre a predileção de Deus pelos pobres e o desejo divino de ouvir o seu clamor – que evoquei brevemente – encontra em Jesus de Nazaré a sua plena realização. [14] Na sua encarnação, Ele «esvaziou-se a si mesmo, tomando a condição de servo. Tornando-se semelhante aos homens e sendo, ao manifestar-se, identificado como homem» ( Fl 2, 7), nesta condição realizou a nossa salvação. Trata-se de uma pobreza radical, fundada na sua missão de revelar a verdadeira face do amor divino (cf. Jo 1, 18; 1 Jo 4, 9). Por isso, São Paulo pode afirmar com uma das suas maravilhosas sínteses: «Conheceis bem a bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza» ( 2 Cor 8, 9).

 

19. Com efeito, o Evangelho mostra que esta pobreza abrangia todos os aspectos da sua vida. Desde a sua entrada no mundo, Jesus experimentou as dificuldades relacionadas com a rejeição. O evangelista Lucas, narrando a chegada a Belém de José e Maria, já próxima do momento do parto, observa com pena «não haver lugar para eles na hospedaria» (Lc 2, 7). Jesus nasceu em condições humildes: logo após o nascimento, foi recostado numa manjedoura, e, pouco tempo depois, os seus pais fugiram para o Egito para o salvar da morte (cf. Mt 2, 13-15). No início da sua vida pública, foi expulso de Nazaré depois de ter anunciado na sinagoga que se cumpria n’Ele o ano da graça no qual os pobres se rejubilam (cf. Lc 4, 14-30). Não houve um lugar acolhedor nem sequer no momento de sua morte: a fim de ser crucificado, levaram-no para fora de Jerusalém (cf. Mc 15, 22). É nesta condição que se pode resumir claramente a pobreza de Jesus. Trata-se da mesma exclusão que caracteriza a definição dos pobres: eles são os excluídos da sociedade. Jesus é a revelação deste privilegium pauperum. Ele apresenta-se ao mundo não só como Messias pobre, mas também como Messias dos pobres e para os pobres.

 

20. Existem alguns indícios a propósito da condição social de Jesus. Em primeiro lugar, Ele realiza o ofício de artesão ou carpinteiro, téktōn (cf. Mc 6, 3). Trata-se de uma categoria de pessoas que vivem do seu trabalho manual. Não possuindo terrenos, eram considerados inferiores em relação aos agricultores. Quando o Menino Jesus é apresentado no Templo, por José e Maria, os seus pais ofereceram um par de rolas ou de pombas (cf. Lc 2, 22-24), que segundo as prescrições do Livro do Levítico (cf. 12, 8) constituía a oferta dos pobres. Um episódio evangélico bastante significativo é aquele que nos conta como Jesus e os seus discípulos colhiam espigas para se alimentarem, enquanto atravessavam os campos (cf. Mc 2, 23-28) e isto – respigar os campos – era permitido somente a quem era pobre. Além disso, o próprio Jesus diz de si mesmo: «As raposas têm tocas e as aves do céu têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça» (Mt 8, 20; Lc 9, 58). Na verdade, Ele é um mestre itinerante, cuja pobreza e precaridade são sinais do vínculo com o Pai e são pedidas também a quem deseja segui-lo no caminho do discipulado, precisamente para que a renúncia aos bens, às riquezas e às seguranças deste mundo seja um sinal visível do ter-se confiado a Deus e à sua providência.

 

21. No início do seu ministério público, Jesus apresenta-se na sinagoga de Nazaré lendo o livro de Isaías e aplicando a si mesmo a palavra do profeta: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres» (Lc 4, 18; cf. Is 61, 1). Ele manifesta-se, portanto, como Aquele que, no hoje da história, vem realizar a proximidade amorosa de Deus, que em primeiro lugar é obra de libertação para quem está prisioneiro do mal, para os fracos e os pobres. Na verdade, os sinais que acompanham a pregação de Jesus são manifestações de amor e de compaixão com as quais Deus olha para os doentes, os pobres e os pecadores que, em virtude da sua condição, eram marginalizados na sociedade, inclusivamente pela religião; Ele abre os olhos aos cegos, cura os leprosos, ressuscita os mortos e anuncia aos pobres a boa nova: Deus fez-se próximo, Deus ama-vos (cf. Lc 7, 22). Isto explica a razão pela qual Ele proclama: «Felizes vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus» (Lc 6, 20). Efetivamente, Deus mostra predileção pelos pobres: a eles primeiramente se dirige a palavra de esperança e libertação do Senhor e por isso ninguém, apesar da condição de pobreza ou fraqueza, deve sentir-se abandonado. E a Igreja, se deseja ser de Cristo, deve ser Igreja das Bem-aventuranças, Igreja que dá vez aos pequeninos e caminha pobre com os pobres, lugar onde os pobres têm um espaço privilegiado (cf. Tg 2, 2-4).

 

22. Incapazes de se prover do necessário para viver, os indigentes e os enfermos eram frequentemente obrigados a mendigar. A isso somava-se o peso da vergonha social, alimentada pela convicção de que a doença e a pobreza estavam ligadas a algum pecado pessoal. Jesus combateu com firmeza aquele modo de pensar, afirmando: «o vosso Pai que está no Céu faz com que o Sol se levante sobre os bons e os maus e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores» (Mt 5, 45). E, inclusive, inverteu mesmo completamente tal concepção, como está bem exemplificado na parábola do rico avarento e do pobre Lázaro: «Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em vida, enquanto Lázaro recebeu somente males. Agora, ele é consolado, enquanto tu és atormentado» (Lc 16, 25).

 

23. Compreende-se, então, que «deriva da nossa fé em Cristo, que se fez pobre e sempre se aproximou dos pobres e marginalizados, a preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais abandonados da sociedade». Muitas vezes pergunto-me, quando há tanta clareza nas Sagradas Escrituras a respeito dos pobres, por que razão muitos continuam a pensar que podem deixar de prestar atenção aos pobres. Por enquanto, porém, permaneçamos no âmbito bíblico e procuremos refletir sobre a nossa relação com os últimos da sociedade e sobre o lugar fundamental que eles ocupam no povo de Deus.

 

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