29. A decadência ética do poder real é disfarçada pelo marketing e pela informação falsa, mecanismos úteis nas mãos de quem tem maiores recursos para influenciar a opinião pública através deles. Com a ajuda destes mecanismos, quando se pretende iniciar um projeto com forte impacto ambiental e elevados efeitos poluidores, iludem-se os habitantes da região falando do progresso local que se poderá gerar ou das oportunidades económicas, ocupacionais e de promoção humana que isso trará para os seus filhos. Na realidade, porém, falta um verdadeiro interesse pelo futuro destas pessoas, porque não lhes é dito claramente que, na sequência de tal projeto, terão uma terra devastada, condições muito mais desfavoráveis para viver e prosperar, uma região desolada, menos habitável, sem vida e sem a alegria da convivência e da esperança, para além do dano global que acaba por prejudicar a muitos mais.
30. Basta pensar no efémero entusiasmo pelo dinheiro recebido em troca do depósito de resíduos tóxicos num sítio. A casa adquirida com aquele dinheiro transformou-se num túmulo por causa das doenças que se desencadearam. E não falo impelido por uma imaginação desenfreada, mas por algo que vivemos. Poder-se-ia dizer que este é um exemplo extremo, mas não é possível falar de danos «menores», porque foi precisamente a soma de muitos danos considerados toleráveis que acabou por nos levar à situação em que nos encontramos agora.
31. Tal situação não tem a ver apenas com a física ou a biologia, mas também com a economia e o nosso modo de a conceber. A lógica do máximo lucro ao menor custo, disfarçada de racionalidade, progresso e promessas ilusórias, torna impossível qualquer preocupação sincera com a casa comum e qualquer cuidado pela promoção dos descartados da sociedade. Nos últimos anos, podemos notar como às vezes os próprios pobres, confundidos e encantados perante as promessas de tantos falsos profetas, caem no engano dum mundo que não é construído para eles.
32. Incrementam-se ideias erradas sobre a chamada «meritocracia», que se tornou um «merecido» poder humano ao qual tudo se deve submeter, um domínio daqueles que nasceram com melhores condições de progresso. Caso diverso é a sadia abordagem do valor do compromisso, do desenvolvimento das próprias capacidades e dum louvável espírito de iniciativa; mas se não se procura uma real igualdade de oportunidades, a meritocracia facilmente se transforma num para-vento que consolida ainda mais os privilégios de poucos com maior poder. Nesta lógica perversa, que lhes importa os danos à casa comum, se se sentem seguros sob a suposta armadura dos recursos económicos que obtiveram com as suas capacidades e esforços?
33. Na própria consciência e pensando nos filhos que pagarão os danos das minhas ações, coloca-se a questão do sentido: Qual é o sentido da minha vida? Qual é o sentido da minha passagem por esta terra? Qual é, em última análise, o sentido do meu trabalho e do meu compromisso?