OS MIGRANTES

OS MIGRANTES

31. O Médio Oriente é uma realidade rica pela sua diversidade, mas demasiadas vezes constrangedora e mesmo violenta; isto toca o conjunto dos habitantes da região e os vários aspectos da sua vida. Mas os cristãos, que se vêem frequentemente colocados numa posição delicada, ressentem-se de forma particular, e por vezes com cansaço e pouca esperança, das consequências negativas destes conflitos e incertezas. Muitas vezes sentem-se humilhados; quando há desordens, sabem, por experiência, que são vítimas proscritas. Depois de terem, ao longo dos séculos, tomado parte activa na construção da respectiva nação contribuindo para a formação da sua identidade e a prosperidade da mesma, numerosos são os cristãos que escolhem céus mais propícios, lugares de paz onde eles e suas famílias possam viver com dignidade e segurança, e espaços de liberdade onde a sua fé se possa exprimir sem estarem sujeitos a constrições de todo o género. Esta escolha é dilacerante: afecta gravemente os indivíduos, as famílias e as Igrejas; mutila as nações e contribui para o empobrecimento humano, cultural e religioso do Médio Oriente. Na verdade, um Médio Oriente sem ou com poucos cristãos já não é o Médio Oriente, visto que os cristãos fazem parte com os outros crentes da identidade muito particular da região; uns são responsáveis pelos outros diante de Deus. Por isso, é importante que os líderes políticos e os responsáveis religiosos entendam esta realidade e evitem uma política ou uma estratégia que privilegie apenas uma das comunidades criando um Médio Oriente monocromático, que deixaria absolutamente de reflectir a sua rica realidade humana e histórica.

 

32. Os pastores das Igrejas orientais católicas sui iuris constatam, com preocupação e tristeza, que o número dos seus fiéis diminui nos territórios tradicionalmente patriarcais, vendo-se desde há algum tempo obrigados a desenvolver uma pastoral da emigração. Estou certo de que eles fazem o possível por exortar os seus fiéis à esperança, animando-os a permanecer no seu país sem vender os próprios bens. Encorajo-os, porém, a continuarem a rodear de afecto os seus presbíteros e fiéis na diáspora, convidando-os a manterem-se em estreito contacto com as suas famílias e Igrejas e sobretudo a guardarem fielmente a sua fé em Deus preservando a sua identidade religiosa que está construída sobre veneráveis tradições espirituais. Conservando a própria adesão a Deus e às respectivas Igrejas e cultivando um amor profundo aos seus irmãos e irmãs latinos, proporcionarão um grande benefício ao conjunto da Igreja Católica. Entretanto exorto os pastores das circunscrições eclesiásticas que acolhem os católicos orientais: a recebê-los caridosamente como irmãos, a favorecer os laços de comunhão entre os emigrantes e as suas Igrejas de proveniência, a possibilitar que celebrem segundo as tradições próprias e realizem, onde for possível, actividades pastorais e paroquiais.

 

33. A Igreja latina presente no Médio Oriente, embora sofrendo a hemorragia de muitos dos seus fiéis, encontra-se hoje a braços com outra situação que a interpela pedindo resposta para novos e variados desafios pastorais. Os seus pastores devem ter em conta a chegada massiva e a presença, nos países de economia forte na região, de trabalhadores de todo o tipo vindos da África, do Extremo Oriente e da Índia. Estes grupos, frequentemente formados por homens e mulheres sozinhos ou por famílias inteiras, enfrentam uma dupla precariedade: são estrangeiros no país onde trabalham, e vivem muitas vezes situações de discriminação e injustiça. Objecto da solicitude de Deus, o estrangeiro merece respeito; o seu acolhimento será tido em conta no Juízo Final (cf. Mt 25, 35.43).

 

34. Estas pessoas, tantas vezes exploradas sem se poder defender e na posse de contratos de trabalho mais ou menos precários ou legais, são vítimas de infracção das leis locais e das convenções internacionais; além disso, padecem fortes pressões e graves restrições religiosas. O dever dos seus pastores é necessário e delicado; a todos os fiéis católicos e a todos os presbíteros, qualquer que seja a Igreja a que pertençam, encorajo à comunhão sincera e à colaboração pastoral com o Bispo local; e exorto este a uma paterna compreensão para com os fiéis orientais. É através duma colaboração conjunta e sobretudo falando em uníssono que, nesta situação particular, todos poderão viver e celebrar a sua fé enriquecendo-se com a diversidade das tradições espirituais sem deixar de permanecer em contacto com as comunidades cristãs de origem. Convido também os governantes dos países que recebem estas pessoas a respeitar e defender os seus direitos, a permitir-lhes a livre expressão da fé, favorecendo a liberdade religiosa e a edificação de lugares de culto. A liberdade religiosa « poderia tornar-se objecto de diálogo entre os cristãos e os muçulmanos, diálogo cuja urgência e utilidade foram reiteradas pelos Padres sinodais ».

 

35. Enquanto alguns católicos naturais do Médio Oriente, por necessidade, cansaço ou desânimo, optam dramaticamente por deixar a terra dos seus antepassados, a própria família e comunidade de fé, outros há que, cheios de esperança, tomam a decisão de permanecer no seu país e na sua comunidade. Encorajo-os a consolidarem esta nobre fidelidade e a permanecerem firmes na fé. Por fim, outros católicos, abraçando uma opção tão dilacerante como a dos cristãos do Médio Oriente que emigram para fugir da precariedade na esperança de construir um futuro melhor, escolhem os países da região para trabalhar e viver.

 

36. Como Pastor da Igreja universal, dirijo-me ao conjunto dos fiéis católicos da região – naturais e adventícios, cuja proporção numérica se tem aproximado nos últimos anos – já que, para Deus, todos formam um só povo e, para os crentes, há uma só fé: procurai viver respeitosamente unidos uns com os outros no amor e na estima recíproca e em comunhão fraterna, para dardes um testemunho credível da vossa fé na morte e ressurreição de Cristo! Deus ouvirá a vossa oração, abençoará a vossa conduta e dar-vos-á o seu Espírito para suportardes o peso do dia. Na verdade, « onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade » (2 Cor 3, 17). Aos fiéis que experimentavam situações semelhantes, São Pedro escreveu palavras que de bom grado retomo aqui para vos exortar: « Quem vos poderá fazer mal, se fordes zelosos em praticar o bem? (...) Não temais as suas ameaças, nem vos deixeis perturbar; mas, no íntimo do vosso coração, confessai Cristo como Senhor, sempre dispostos a dar razão da vossa esperança a todo aquele que vo-la peça » (1 Pd 3, 13-15).

 

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