167. É preciso voltar à Palavra de Deus para reconhecer que a melhor resposta ao amor do seu Coração é o amor aos irmãos; não há maior gesto que possamos oferecer-lhe para retribuir amor por amor. A Palavra de Deus di-lo com toda a clareza:
«Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40).
«Toda a Lei se cumpre plenamente nesta única palavra: Ama o teu próximo como a ti mesmo» (Gl 5, 14).
«Nós sabemos que passámos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Quem não ama, permanece na morte» (1 Jo 3, 14).
«Aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê» (1 Jo 4, 20).
168. O amor aos irmãos não se fabrica, não é fruto do nosso esforço natural, mas exige uma transformação do nosso coração egoísta. Nasce então espontaneamente a célebre súplica: “Jesus, fazei o nosso coração semelhante ao Vosso”. Por isso mesmo, o convite de São Paulo não era: “Esforçai-vos por fazer boas obras”. O seu convite era mais precisamente: «Tende entre vós os mesmos sentimentos, que estão em Cristo Jesus» (Fl 2, 5).
169. É bom lembrar que no Império Romano muitos pobres, forasteiros e tantos outros descartados encontravam respeito, carinho e cuidado nos cristãos. Isto explica o raciocínio do imperador apóstata Juliano, que se perguntava porque é que os cristãos eram tão respeitados e seguidos, considerando que uma das razões era o seu empenho na assistência aos pobres e forasteiros, já que o Império os ignorava e desprezava. Para este imperador, era intolerável que os pobres não recebessem ajuda de sua parte, enquanto os odiados cristãos «alimentam os seus, e também os nossos». Numa carta, insiste, em particular, na ordem de criar instituições de caridade para competir com os cristãos e atrair o respeito da sociedade: «Estabelece em todas as cidades alojamentos numerosos para que os estrangeiros possam gozar da nossa humanidade. [...] Habitua os helenos às obras de beneficência». Mas não atingiu o seu objetivo, porque por detrás destas obras não havia seguramente o amor cristão, que permitia reconhecer a cada pessoa uma dignidade única.
170. Identificando-se com os últimos da sociedade (cf. Mt 25, 31-46), «Jesus trouxe a grande novidade do reconhecimento da dignidade de cada pessoa, como também e sobretudo daquelas qualificadas como “indignas”. Este princípio novo na história, pelo qual o ser humano é tanto mais “digno” de respeito e de amor quanto mais é fraco, mísero e sofredor, a ponto de perder a própria “figura” humana, mudou o rosto do mundo, dando vida a instituições que se dedicam a cuidar daqueles que se encontram em condições desumanas: os recém-nascidos abandonados, os órfãos, os idosos deixados sozinhos, os doentes mentais, os portadores de doenças incuráveis ou com graves malformações, os sem-teto».
171. Mesmo do ponto de vista da ferida do seu Coração, olhar para o Senhor, que «tomou as nossas enfermidades e carregou as nossas dores» ( Mt 8, 17), ajuda-nos a prestar mais atenção ao sofrimento e às necessidades dos outros, e torna-nos suficientemente fortes para participar na sua obra de libertação, como instrumentos de difusão do seu amor. Se contemplarmos a entrega de Cristo por todos, torna-se inevitável perguntarmo-nos por que razão não somos capazes de dar a nossa vida pelos outros: «Foi com isto que ficámos a conhecer o amor: Ele, Jesus, deu a sua vida por nós; assim também nós devemos dar a vida pelos nossos irmãos» (1 Jo 3, 16).