RELIGIÃO E VIOLÊNCIA

RELIGIÃO E VIOLÊNCIA

281. Entre as religiões, é possível um caminho de paz. O ponto de partida deve ser o olhar de Deus. Porque, «Deus não olha com os olhos, Deus olha com o coração. E o amor de Deus é o mesmo para cada pessoa, seja qual for a religião. E se é um ateu, é o mesmo amor. Quando chegar o último dia e houver a luz suficiente na terra para poder ver as coisas como são, não faltarão surpresas!»

 

282. Também «os crentes precisam de encontrar espaços para dialogar e atuar juntos pelo bem comum e a promoção dos mais pobres. Não se trata de nos tornarmos todos mais volúveis nem de escondermos as convicções próprias que nos apaixonam, para podermos encontrar-nos com outros que pensam de maneira diferente. (…) Com efeito, quanto mais profunda, sólida e rica for uma identidade, mais enriquecerá os outros com a sua contribuição específica». Como crentes, somos desafiados a retornar às nossas fontes para nos concentrarmos no essencial: a adoração de Deus e o amor ao próximo, para que alguns aspetos da nossa doutrina, fora do seu contexto, não acabem por alimentar formas de desprezo, ódio, xenofobia, negação do outro. A verdade é que a violência não encontra fundamento algum nas convicções religiosas fundamentais, mas nas suas deformações.

 

283. O culto sincero e humilde a Deus «leva, não à discriminação, ao ódio e à violência, mas ao respeito pela sacralidade da vida, ao respeito pela dignidade e a liberdade dos outros e a um solícito compromisso em prol do bem-estar de todos». Na realidade, «aquele que não ama não chegou a conhecer a Deus, pois Deus é amor» (1 Jo 4, 8). Por isso, «o terrorismo execrável que ameaça a segurança das pessoas, tanto no Oriente como no Ocidente, tanto no Norte como no Sul, espalhando pânico, terror e pessimismo não se deve à religião – embora os terroristas a instrumentalizem – mas tem origem no cúmulo de interpretações erradas dos textos religiosos, nas políticas de fome, de pobreza, de injustiça, de opressão, de arrogância; por isso, é necessário interromper o apoio aos movimentos terroristas através do fornecimento de dinheiro, de armas, de planos ou justificações e também a cobertura mediática, e considerar tudo isto como crimes internacionais que ameaçam a segurança e a paz mundial. É preciso condenar tal terrorismo em todas as suas formas e manifestações». As convicções religiosas sobre o sentido sagrado da vida humana consentem-nos «reconhecer os valores fundamentais da nossa humanidade comum, valores em nome dos quais se pode e deve colaborar, construir e dialogar, perdoar e crescer, permitindo que o conjunto das diferentes vozes forme um canto nobre e harmonioso, e não gritos fanáticos de ódio».

 

284. Às vezes, a violência fundamentalista desencadeia-se em alguns grupos de qualquer religião pela imprudência dos seus líderes. Mas «o mandamento da paz está inscrito nas profundezas das tradições religiosas que nós representamos. (...) Nós, líderes religiosos, somos chamados a ser verdadeiros “dialogantes”, a agir na construção da paz, e não como intermediários, mas como mediadores autênticos. Os intermediários procuram contentar todas as partes, com a finalidade de obter um lucro para si mesmos. O mediador, ao contrário, é aquele que nada reserva para si próprio, mas que se dedica generosamente, até se consumir, consciente de que o único lucro é a paz. Cada um de nós é chamado a ser um artífice da paz, unindo e não dividindo, extinguindo o ódio em vez de o conservar, abrindo caminhos de diálogo em vez de erguer novos muros».

 

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