41. Entre os Padres orientais, talvez o mais ardoroso pregador da justiça social seja São João Crisóstomo, Arcebispo de Constantinopla na passagem do século IV ao século V. Nas suas homilias, exorta os fiéis a reconhecer Cristo nos necessitados: «Queres honrar o Corpo de Cristo? Não permitas que seja desprezado nos seus membros, isto é, nos pobres que não têm que vestir, nem O honres aqui no templo com vestes de seda, enquanto lá fora O abandonas ao frio e à nudez. [...] No templo o Corpo de Cristo não precisa de mantos, mas de almas puras; mas na pessoa dos pobres, Ele precisa de todo o nosso cuidado. Aprendamos, portanto, a refletir e a honrar a Cristo como Ele quer. Quando pretendemos honrar alguém, devemos prestar-lhe a honra que ele prefere e não a que mais nos agrada [...]. Assim deves também tu prestar-Lhe aquela honra que Ele mesmo ordenou, distribuindo pelos pobres as tuas riquezas. Deus não precisa de vasos de ouro, mas de almas de ouro». Afirmando com clareza meridiana que, se os fiéis não encontram Cristo nos pobres à sua porta, tampouco serão capazes de prestar-Lhe culto no altar, prossegue: «De que serviria, afinal, adornar a mesa de Cristo com vasos de ouro, se Ele morre de fome na pessoa dos pobres? Primeiro dá de comer a quem tem fome, e depois ornamenta a sua mesa com o que sobra». Entendia a Eucaristia, portanto, também como uma expressão sacramental da caridade e da justiça que a precediam, a acompanhavam e deveriam dar continuidade a ela no amor e na atenção aos pobres.
42. Sendo assim, a caridade não é uma via opcional, mas o critério do verdadeiro culto. Crisóstomo denunciava com veemência o luxo exacerbado, que convivia com a indiferença em relação aos pobres. A atenção que lhes é devida, mais do que mera exigência social, é condição de salvação, o que atribui à riqueza injusta um peso de condenação: «Faz muito frio e o pobre jaz em farrapos, moribundo enregelado, rangendo os dentes, com aspecto e veste que te deviam comover. Tu, contudo, aquecido e ébrio passas adiante. E como queres que Deus te livre da infelicidade? [...] Muitas vezes a um cadáver insensível, que já não percebe a honra, ornas com muitas vestes variegadas e douradas. Todavia desprezas aquele que sente dor, é dilacerado, torturado, atormentado pela fome e o frio, e dás mais valor à vanglória que ao temor de Deus». Este profundo senso de justiça social leva-o a afirmar que «não dar aos pobres é roubá-los, é defraudar a vida deles, pois a eles pertence o que possuímos».